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No começo da sua história, lá em 1964, a atual gigante Nike tinha um nome bem diferente: Blue Ribbon Sports. Nessa época, em vez de produzir as suas próprias mercadorias, a empresa só distribuía alguns tênis da japonesa Onitsuka Tiger — que hoje conhecemos como Asics. Mais de meio século depois, ela é reconhecida por sua altíssima qualidade, a sua presença no meio esportivo e, claro, o seu sistema de integração entre o mundo físico e a loja virtual, a chamada estratégia omnichannel.
Mas o que tem de tão especial no e-commerce da Nike? O que exatamente o faz tão diferente? Para resumir em poucas palavras, podemos dizer que o grande destaque nesse caso está na estratégia de integração de mídia adotada pela empresa. Se você quer saber mais sobre o assunto, continue a leitura!
Um breve panorama sobre o omnichannel
Uma estratégia de varejo omnichannel é uma abordagem de vendas e marketing que oferece aos clientes uma experiência de compra totalmente integrada, unindo a vivência do usuário na loja física aos recursos do site mobile, das redes sociais e de todos outros canais em que a empresa atua.
O cliente pode fazer compras online a partir de um computador, um dispositivo móvel, por telefone ou em uma loja física, e a experiência seria sempre semelhante e multifacetada.
É importante distinguir a experiência omnichannel da multicanal. Essencialmente, tudo se resume à profundidade da integração.
A diferença da estratégia multicanal
Todas as aplicações da estratégia omnichannel usarão vários canais, mas nem todas as experiências multicanais são omnichannel. Você pode ter um planejamento incrível de marketing móvel, campanhas nas redes sociais e um site bem projetado. Contudo, se eles não trabalham juntos, a empresa não tem uma estratégia omnichannel.
O multicanal é um conceito adotado pela maioria das empresas hoje. Elas têm site, blog, Facebook, Instagram e Twitter, e usam cada uma dessas plataformas para se envolver e se conectar com o público-alvo. No entanto, na maioria dos casos, o cliente ainda não tem uma experiência consistente que conecte cada uma dessas redes.
Uma tática omnichannel, por outro lado, contabiliza cada plataforma e dispositivo que uma pessoa usará para interagir com a empresa e projeta o sistema de forma integrada. As empresas que usam essa metodologia alinham mensagens, metas, objetivos e design em cada mídia.
Trata-se, portanto, de uma estratégia mais elaborada. Afinal, gerir um único canal, como o Facebook, já exige capacidade de programação e gestão. Unir todos os canais envolve um nível de administração ainda mais detalhado.
A criação do omnichannel
Assim como a Nike, esse formato não surgiu ontem. Inicialmente intitulado como customer centricity (que podemos traduzir como foco no cliente), ele se popularizou a partir da estratégia da Best Buy, iniciada no início dos anos 2000, para competir contra a gigantesca Walmart.
A proposta da loja era de que o consumidor deveria ter uma experiência 360º, seja na loja física, no e-commerce ou em qualquer outro ponto de interação.
A ideia deu tão certo que, hoje em dia, o omnichannel já é adotado com muito sucesso por diversas empresas, incluindo o Walmart, a Disney e a Starbucks. Elas exploram várias plataformas em sua estratégia, muitas das quais sequer existiam ou que não eram tão populares naquela época — como as redes sociais e os aplicativos para celular, que, aliás, são bastante presentes no e-commerce da Nike.
O e-commerce da Nike e a lealdade à marca
Apesar de já ter o seu e-commerce funcionando desde a virada do século passado, foi só em 2006 que a ideia do omnichannel começou a crescer com a Nike. E isso se deve principalmente ao programa NikePlus, lançado antes mesmo do primeiro iPhone.
Basicamente, o NikePlus conectava o tênis do usuário com o seu iPod, possibilitando a contagem dos passos, a distância percorrida e as calorias queimadas. Os dados eram então sincronizados com o site da NikePlus.
Esse sistema promoveu não apenas uma experiência positiva, mas a reunião de pessoas com interesses em comum: formou-se uma comunidade de corredores, tanto profissionais quanto amadores.
Portanto, a retenção do consumidor por meio da formação de uma comunidade está no centro da estratégia omnichannel da Nike, que atua online e utiliza o programa de fidelidade, visando unir todos os canais da empresa.
A proposta da Nike atualmente é o programa NikePlus expandido, que eles descrevem em um press release como um sistema que atua “Conectando a riqueza de conhecimento esportivo da Nike com suas ofertas de calçados e vestuário. O Nike + traduz o ‘mais’ para o ‘pessoal’, oferecendo aos membros orientação personalizada, suporte e uma variedade de recursos que revelam o melhor da Nike”.
O NikePlus tem como objetivo conhecer bem o usuário — quais são as suas sub-marcas favoritas da Nike (por exemplo, Air Jordan, NIKEiD, Converse etc.), quais esportes eles praticam e em que tipos de produtos eles estão interessados. Tudo isso é utilizado para produzir conteúdo por meio de um newsfeed personalizado.
Os anúncios e as reservas de produtos são particularmente relevantes no programa NikePlus, considerando a rapidez com que os seus produtos se esgotam.
Mais importante, o aplicativo NikePlus serve como um gateway para conectar os membros ao resto da constelação de aplicativos da Nike — o Nike + Run Club, o Nike + Training Club e os aplicativos Nike + SNKRS.
A comprovação de que o sistema funciona vêm dos resultados da empresa: em uma entrevista à CodeCommerce, a diretora de consumo direto da Nike, Heidi O’Neill, disse que os membros da NikePlus consomem três vezes o valor de um comprador anônimo.
Portanto, a estratégia omnichannel pode transformar compradores ocasionais em clientes leais e impulsionar o consumo.
A retenção de clientes no físico e no virtual
Uma série de pesquisas apontam essa estratégia como uma excelente forma de trabalhar a retenção dos clientes. Recentemente, a Harvard Business Review analisou o comportamento de 46.000 compradores para avaliar o impacto do varejo omnichannel em sua experiência. A pesquisa concluiu que:
- 7% compraram online exclusivamente;
- 20% eram apenas de lojas físicas;
- 73% usaram vários canais para pesquisar e comprar.
Além disso, os resultados mostraram que os clientes omnichannel adoravam usar diferentes pontos de contato, adotando diversas combinações de canais. Eles não apenas usavam aplicativos de smartphones para comparar preços ou fazer o download de um cupom, por exemplo, mas também eram ávidos usuários de ferramentas digitais na loja, como um catálogo interativo, um verificador de preços ou um tablet.
Outro estudo da Fluent concluiu que os usuários que se envolveram com uma determinada marca em várias mídias fizeram compras com mais frequência. A pesquisa fez a seguinte pergunta: com que frequência você faz compras no site da sua loja favorita?
O resultado mostrou que 49% das pessoas que acompanham 10 ou mais canais de um negócio fazem compras uma vez por semana no site da empresa. Desse grupo, outros 36% compram no site ao menos uma vez por mês. Ou seja, clientes fiéis, que acompanham a sua marca favorita em vários canais, compram online de maneira recorrente.
A pesquisa também concluiu que 52% que acompanham entre um e 4 canais compram online menos de uma vez por mês. Apesar de ainda ser um indicador relevante, os dados demonstram que a frequência de compras dos clientes engajados em diversos canais é muito maior.
Portanto, quando o cliente segue e interage com uma companhia em diversos meios, ele tende a se tornar mais leal e a comprar com mais frequência.
Estratégia bilionária
Com esse modelo de vendas focado na criação de compradores leais, a Nike conseguiu criar ofertas personalizadas para as necessidades de cada usuário do app. No fim das contas, isso ajudou bastante a empresa a chegar no incrível número de 2 bilhões de dólares de faturamento só com vendas online. Entretanto, essa retenção de clientes não ficou limitada ao e-commerce.
Uma boa conexão entre lojas virtuais e físicas pode ser bastante benéfica para as empresas. Tudo graças ao efeito ROPO, sigla em inglês para Research Online Purchase Offline — pesquisa online e compra offline. A ideia é que, para cada dólar gasto no e-commerce, praticamente outro seja gasto pelo mesmo usuário em uma loja física posteriormente. Aí entra o sistema de distribuição como ponto crucial para a estratégia omnichannel de qualquer loja virtual.
A importância da distribuição
Empresas que buscam oferecer uma experiência 360º precisam diversificar bastante a forma de entrega de seus produtos. E isso vale tanto para o comprador online como para o offline e até para o revendedor. Para você ter uma ideia melhor, veja só como tudo isso funciona o caso da Nike.
Para consumidores
No caso do B2C, temos:
- lojas físicas — em alguns casos, específicas para certos modelos de tênis;
- outlets;
- e-commerce;
- NIKEiD — loja virtual da Nike focada na venda de tênis personalizados.
Para revendedores
Já no caso do B2B, temos:
- revenda dos produtos em lojas físicas credenciadas pelo Nike retailer;
- revenda dos produtos em lojas virtuais e marketplaces credenciados.
Além desses modelos de distribuição e contato, a Nike ainda conta com vendas por meio das redes sociais, como o Instagram. Sem dúvida, esse cenário mostra a facilidade da empresa em lidar com várias das ferramentas disponíveis no mercado.
As vantagens da ampla presença
Existe uma demanda por parte dos consumidores dessa estratégia. É isso que afirma o relatório da Zendesk chamado The Omnichannel Customer Service Gap — em tradução literal, a lacuna de atendimento ao cliente omnichannel.
O relatório afirma que, nos últimos anos, as empresas têm se concentrado cada vez mais no desenvolvimento de estratégias omnichannel. No entanto, existe uma dificuldade de desenvolver uma maneira adequada de se dirigir ao consumidor em canais tão diferentes quanto um site mobile e o Facebook, de forma que exista uma unidade nessa comunicação.
Essas técnicas, se executadas de maneira inadequada, fazem com que os compradores se sintam negligenciados. O relatório também afirma que os consumidores têm uma ideia muito clara sobre o que esperam em termos de suporte. A maioria se sente decepcionada quando essas expectativas não são correspondidas.
Dado que as recompensas para uma estratégia omnichannel adequada incluem maiores gastos, melhor fidelização e o cultivo de valiosos embaixadores da marca, é surpreendente que as empresas não estejam fazendo mais para satisfazer o seu público nesse campo. Por isso, o exemplo da Nike é tão valioso.
Apesar de ter o seu próprio app de corrida, a Nike sabe bem da importância de usar todas as ferramentas disponíveis no mercado para criar uma boa interação com as pessoas. Por isso, ela também se faz presente em outros aplicativos e até em aparelhos, como o Apple Watch.
A presença em outros e-commerces é uma necessidade para os usuários. Exatamente por isso, no ano passado, a Nike se tornou uma parceira especial da Amazon, podendo, assim, negociar preços e entregas, a fim de garantir que a experiência de seus consumidores continuasse positiva, mesmo fora do ambiente controlado pela empresa.
A ajuda da identidade visual
Por fim, não podemos deixar de falar da importância da identidade visual para o sucesso não só da Nike como para qualquer comércio.
No caso da Nike, seja nas lojas do mundo digital ou offline, a empresa cuidou para manter a paleta de cores e texturas igual, criando uma identidade fixa. Assim é mais fácil entrar em conexão com a marca, seja em qual ambiente for.
Outro ponto interessante é que a Nike se preocupa em tornar todas as lojas extremamente acessíveis para os usuários, melhorando ainda mais a sua experiência durante o processo de compra. Qualquer que seja o seu segmento de atuação ou o porte da sua empresa, pode acreditar: seguir essa lógica só traz vantagens.
Como você pôde ver por aqui, não é de se admirar que essa técnica da Nike esteja fazendo tanto sucesso. Projetada para entregar a melhor experiência possível para as pessoas, a ideia aqui é que a empresa tenha mais que apenas clientes, mas sim compradores leais. Nada mais justo para uma marca que, há mais de 50 anos, tem pensado em como fazer a diferença tanto dentro quanto fora da internet.
*Artigo publicado originalmente em janeiro de 2018 e atualizado em março de 2020.